quarta-feira, março 21, 2007

Momentos....

é bom termos os nossos momentos, os nossos instantes, as nossas memórias, segundos, minutos, horas em que nos passa pela memória um filme em versão curta das nossas vidas, daquilo que passámos em tempos, daquilo que um dia fizémos e que nos influencia o nosso dia a dia, seja bom ou mau...é importante termos esses momentos só nossos em que podemos divagar pensar naquilo que será o dia de amanhã, ou naquilo que já passou e já não volta e nos deixa uma saudade e um sabor a pouco de tanta coisa que no momento em que foi, foram coisas simplíssimas.



é nestes precisos momentos que se dão valor a certas coisas na vida, como o companheirismo, a confiança, a entreajuda, os erros, aquilo que nos fez rir ou chorar, enfim, todas as memórias que de uma maneira ou outra nos marcaram até hoje... será melancolia será realismo?? talvez essa resposta apareça numa próxima insónia...

mas estes momentos por vezes sabem mesmo bem...

cá fica então um poema de Álvaro de Campos..ilustrando algumas das coisas que disse.

Na Noite Terrivel de Alvaro de Campos..

Na noite terrível, substância natural de todas as noites,
Na noite de insônia, substância natural de todas as minhas noites,
Relembro, velando em modorra incômoda,
Relembro o que fiz e o que podia ter feito na vida.
Relembro, e uma angústia
Espalha-se por mim todo como um frio do corpo ou um medo.
O irreparável do meu passado — esse é que é o cadáver!
Todos os outros cadáveres pode ser que sejam ilusão.
Todos os mortos pode ser que sejam vivos noutra parte.
Todos os meus próprios momentos passados pode ser que existam algures,
Na ilusão do espaço e do tempo,
Na falsidade do decorrer.

Mas o que eu não fui, o que eu não fiz, o que nem sequer sonhei;
O que só agora vejo que deveria ter feito,
O que só agora claramente vejo que deveria ter sido —
Isso é que é morto para além de todos os Deuses,
Isso — e foi afinal o melhor de mim — é que nem os Deuses fazem viver ...

Se em certa altura
Tivesse voltado para a esquerda em vez de para a direita;
Se em certo momento
Tivesse dito sim em vez de não, ou não em vez de sim;
Se em certa conversa
Tivesse tido as frases que só agora, no meio-sono, elaboro —
Se tudo isso tivesse sido assim,
Seria outro hoje, e talvez o universo inteiro
Seria insensivelmente levado a ser outro também.

Mas não virei para o lado irreparavelmente perdido,
Não virei nem pensei em virar, e só agora o percebo;
Mas não disse não ou não disse sim, e só agora vejo o que não disse;
Mas as frases que faltou dizer nesse momento surgem-me todas,
Claras, inevitáveis, naturais,
A conversa fechada concludentemente,
A matéria toda resolvida...
Mas só agora o que nunca foi, nem será para trás, me dói.

O que falhei deveras não tem sperança nenhuma
Em sistema metafísico nenhum.
Pode ser que para outro mundo eu possa levar o que sonhei,
Mas poderei eu levar para outro mundo o que me esqueci de sonhar?
Esses sim, os sonhos por haver, é que são o cadáver.
Enterro-o no meu coração para sempre, para todo o tempo, para todos os universos,

Nesta noite em que não durmo, e o sossego me cerca
Como uma verdade de que não partilho,
E lá fora o luar, como a esperança que não tenho, é invisível p'ra mim.


Contudo apesar de o parecer em muitas das estrofes desta poesia, nem tudo é negativo e há coisas que merecem ser lembradas...hoje e amanhã!

Sem comentários: